Quarta-feira, 29 de Abril de 2009

OS 250 ANOS DA PASSAGEM DE OEIRAS A CONCELHO

 

DA MEMÓRIA…JOSÉ LANÇA-COELHO
 
DEFENSORES E ATACANTES DO MARQUÊS DE POMBAL (I)
 
            A figura do Marquês de Pombal foi mitificada ao longo da Historia, umas vezes acompanhada de uma carga positiva, quando referenciada por adeptos dos movimentos revolucionários e democráticos dos séculos XIX e XX, nomeadamente, Maçonaria Liberalismo e Iª República, e, outras, com uma forte carga negativa, quando proveniente de sectores religiosos, católicos e jesuítas.
            Daí que, importe ao interessado pela História, fazer um estudo sobre ambos os campos, para, como em tudo que se reporta ao género humano, apontar as coisas boas e as más que são atribuíveis ao Conde de Oeiras.
            Na perspectiva de Reis Torgal (1), o pombalismo apresenta 3 características decisivas: 1 – Corresponde a uma mudança radical do absolutismo, onde a velha nobreza ‘senhorial’ e o clero ultramontano cedem os seus lugares políticos a uma burguesia intelectual e mercantil, a um novo clero e a uma nova nobreza de Estado; 2 – É a primeira grande tentativa de enfrentar decisivamente os problemas económico-               -políticos do país, implicando alterações de fundo sempre geradoras de conflitos; 3 – Ideologicamente apoia-se nos parâmetros do ‘absolutismo esclarecido’ que preconiza, a origem directa do poder, a soberania do rei ou do seu gabinete, e, a oposição sistemática ao ultramontanismo, até aqui considerado como ideologia político-eclesiástica oficial.
            Partindo destas 3 premissas anteriormente enunciadas, há que proceder a uma leitura ideológica das obras escritas pelos autores que, numa perspectiva maniqueísta, se inserem no filopombalismo (os apoiantes de Pombal, como o ministro Sousa Coutinho, que, partindo do despotismo esclarecido, atribuem uma perspectiva laicista e jurisnaturalista à política de Carvalho e Melo) e no antipombalismo (como o próprio nome indica, os opositores da política do Marquês, que tem como principal adversário o Visconde de Vila Nova de Cerveira, que considerava vergonhosa a acção do 1º ministro de D. José I).
            O Marquês de Pombal também tem uma palavra a dizer na análise dicotómica da sua obra e, como é natural, nas suas memórias apologéticas escritas no inverno da sua existência, onde se compara na desgraça a Sully, ministro do rei francês Henrique IV, frisa a importância da sua obra política, ao mesmo tempo que, como todos os megalómanos, acredita que no futuro, ela será exaltada, ao contrário do que acontece com os seus contemporâneos. Esta última opinião foi também expressa pelo monge beneditino, e não jesuíta, saliente-se, como é significativo!, doutor-frei Joaquim de Santa Clara, arcebispo de Évora, na oração fúnebre proferida nas exéquias de Carvalho e Mello, a 8 de Maio de 1872, onde este último é considerado como o homem certo colocado pela providência à frente dos destinos do país, onde levou a efeito uma obra que marcou o reino.
            Durante o liberalismo português regista-se um enorme esforço para reabilitar a acção do futuro Conde de Oeiras, que foi elevada a um marco percursor das conquistas revolucionárias do século XIX, uma vez que a mesma se processou como um ataque aos privilégios da Igreja e da velha Nobreza. Nesta reabilitação da política pombalina, a Maçonaria teve um papel preponderante, transformando Sebastião José num restaurador do prestígio do país no estrangeiro e como um político iluminado que franqueou a entrada do progresso e da liberdade em Portugal.
            Não existem provas suficientes que liguem Pombal à Maçonaria, no entanto, o seu forte empenhamento contra os jesuítas e os privilégios eclesiásticos fez muitos autores acreditarem, principalmente durante o século XIX, que a política pombalina obedecia a uma conspiração da Maçonaria e do ‘despotismo esclarecido’ em toda a Europa contra o poder da Igreja. Deste modo, ao mito luminoso de Pombal, surgiu um outro de sinal contrário, o mito negro dos Jesuítas, tendo ambos emergido da propaganda maçónica, laica e anticlerical contra o obscurantismo e em prol da instauração da nova ordem maçónica do progresso, da igualdade e da fraternidade.
            Surpreendente é que, de acordo com uma ideologia política ultra-absolutista, completamente contrária aos ideais da Revolução Francesa, o Marquês tenha passado para o controlo do Estado as principais actividades produtivas do país, formando companhias monopolistas; ao mesmo tempo que, reformou e estatizou instituições de controlo social, como é o caso paradigmático da Inquisição. Quem tentasse inovar, passando para além dos limites impostos pelo governo era imediatamente preso, facto que se constata com o elevado número de presos políticos. Enquanto na Europa, a imprensa periódica progredia significativamente, em Portugal, o único jornal existente, a Gazeta de Lisboa, foi encerrado por ordem de Pombal. No entanto, diga-se em abono do Conde de Oeiras que, entre as suas medidas positivas, estão o fim da distinção entre cristãos-velhos e cristãos-novos, o decreto da liberdade dos Índios, a reconstrução de Lisboa após o terramoto de 1755, a criação do Erário Régio em 1761 e da Imprensa Régia em 1769, e, na mesma data, a publicação da Lei da Boa Razão.
            Relativamente à reforma do ensino, englobando os parâmetros pedagógicos e científicos do iluminismo europeu, Sebastião José criou o primeiro sistema de ensino estatal europeu, embora os seus efeitos não tenham sido tão transformadores como se quis fazer crer.
 
Notas:
(1) Luís Reis Torgal, História e ideologia, Lisboa, 1989, p. 47.
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Sexta-feira, 24 de Abril de 2009

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OS LIVROS DA MINHA VIDA
                                    
( De A a C)
 
Alguém escreveu que, quando se chega aos 50 anos, surge o tempo de fazer balanços sobre os diversos sectores da nossa vida. Um deles é sobre o que lemos. Autores nacionais e estrangeiros, uns comprados, que ainda permanecem nas estantes da nossa biblioteca particular, outros emprestados, por amigos ou bibliotecas que se frequentam ou frequentaram.
            Os livros, como os discos, são os meus objectos sagrados, ou por mim sacralizados, que me fazem recordar episódios-fragmentos da minha existência e que, têm sempre qualquer evento, de carácter afectivo ligado a eles.
            Em casa, estes companheiros de todas as horas, são mais de dois mil. Depois há os outros que li por empréstimo, alguns deles tão saborosos e inesquecíveis que, mesmo depois de os ler, tive de os comprar para os ter junto a mim até à eternidade, como exemplo do que acabo de afirmar, saltam-me da memória, imediatamente, 1984 de Orwell e Admirável Mundo Novo de Huxley.
Normalmente, as listas que os jornais literários pedem aos escritores são forçosamente sintéticas, não ultrapassando a dezena de títulos, tanto entre os nacionais como os relativos aos estrangeiros. Numa primeira digressão pela minha memória, penso que as minhas listas no concernente aos dois tipos de escritores, ultrapassaria já a dezena, mas como não me quero adiantar, irei servir-me da lista que tenho inscrita na pasta Biblioteca deste mesmo computador onde escrevo presentemente. Se ultrapassar a dezena de títulos em cada uma das listas, como espero que aconteça, tentarei seleccionar - de entre estes, mais os que me emprestaram, pois tenho recensões feitas de todos estes últimos -, os dez autores mais significativos, podendo em cada um desses escritores, citar dois ou mais livros da sua autoria. Por exemplo, ainda sem ver a lista, lembro-me imediatamente, de alguns autores primordiais, de que cito os nomes e algumas obras. Começando pela prata da casa, surgem-me imediatamente na memória, Eça (todos os seus livros, em especial, A Ilustre Casa de Ramires, A Correspondência de Fradique Mendes e o conto filosófico José Matias) Torga (os 16 volumes do Diário, A Criação do Mundo, e O Senhor Ventura), Saramago (Levantado do Chão, O Evangelho Segundo Jesus Cristo, e, A Morte de Ricardo Reis), Pessoa (Mensagem, O Banqueiro Anarquista, Poesia de Alberto Caeiro, Poesia de Álvaro de Campos, O Livro do Desassossego de Bernardo Soares), Álvaro Guerra (Café República, Café Central, Café 25 de Abril, Crimes Imperfeitos), Jorge de Sena (Sinais de Fogo). Só aqui já conto 34 livros!
            Passando aos autores estrangeiros, vêm-me desde logo, transportados pela irreversível corrente do pensamento de William James a que associo o fragmento filosófico do pré-socrático Heraclito, “de que não nos podemos lavar duas vezes na água do mesmo rio”, os seguintes autores: Borges (O Aleph, Ficções, O Livro da Areia), Eco (O Nome da Rosa, A Misteriosa Chama da Rainha Loana), Auster  ( Trilogia de Nova Iorque, Mr. Vertigo). Aqui conto 7 obras-primas!
            Vejamos, então, a lista que se encontra por ordem alfabética:
A
Manuel Alegre (Alma; Rafael); Jorge Amado ( Mar Morto);  António Lobo Antunes (Os Cus de Judas; Livro de Crónicas); Manuel Antunes ( Repensar Portugal; Grandes Contemporâneos; Do Espírito e do Tempo); Aragon (A Semana Santa); Aristóteles (Tratado de Política); Raymond Aron (Ensaio sobre as Liberdades); Arrabal ( Baal Babilónia); Antonin Artaud (Heliogabalo ou o Anarquista Coroado); Machado de Assis ( Don Casmurro); Marco Aurélio ( Pensamentos para mim Próprio);
 
 
B
 Gaston Bachelard (A Psicanálise do Fogo); Francis Bacon (Ensaios); Gonzallo Torrente Ballester (Crónica do Rei Pasmado); Roland Barthes (O Óbvio e o Obtuso); Simone de Beauvoir ( O Existencialismo e a Sabedoria das Nações); Samuel Beckett (Textos para Nada); Saul Bellow (Ravelstein); Nicolau Berdiaeff (Cinco Meditações sobre a Existência); Henri Bergson (O Riso); Norberto Bobbio (Autobiografia); Bocage (Poesias); Boccacio (Decameron); Heinrich Boll (Contos Irónicos); Afonso Botelho (O Hábito de Morrer); Fernanda Botelho (As Contadores de Histórias); Charles Boxer ( O Império Colonial Português 1415-1825); Nuno Bragança ( A Noite e o Riso); Camilo Castelo Branco ( O Olho de Vidro; Memórias do Cárcere); Raul Brandão (Memórias); Joseph Brodsky ( Marca de Água); Giordano Bruno (O Homem de Fogo; Acerca do Infinito, do Universo e dos Mundos); André Bareau (Biografia de Buda); Victor Buescu (Antologia Grego-Latina, apresentação de Manuel Antunes ); Samuel Butler (Erewhon);
C
 Felícia Cabrita (As Mulheres de Salazar); Erskine Caldwell (Ilha de Verão); Ítalo Calvino (O Barão Trepador); Joracy Camargo (Deus lhe Pague); Manuel Severim de Faria (A Vida de Camões); Fernando Campos (A Casa do Pó); Albert Camus (A Peste); Elias Canetti ( As Vozes de Marraquexe); Thomas Carlyle (Os Heróis) ; Mário de Sá-Carneiro ( A Confissão de Lúcio); Alexis Carrel (O Homem esse Desconhecido); Padre Apolinário Casimiro (Para a História da Revolução do Minho 1846 ou Maria da Fonte); Ernest Cassirer ( Ensaio sobre o Homem); Miguel Cervantes (D. Quixote da Mancha; Novelas Exemplares); Mário Cesariny (Jornal do Gato); Teilhard de Chardin (Biografia); Robert Charroux ( História Desconhecida dos Homens); Mário Cláudio (Trilogia da Mão); Catherine Clément ( A Senhora; A Rameira do Diabo); Jacinto do Prado Coelho (A Educação do Sentimento Poético); Trindade Coelho (In Illo Tempore); Coetzee (A Vida e o Tempo de Michael K.); Leonardo Coimbra ( Jesus; S. Francisco de Assis); Augusto Comte (A Importância da Filosofia Positivista); John Banville (Doutor Copérnico); Natália Correia (O Encoberto); Jaime Cortesão ( A Política de Sigilo nos Descobrimentos; L’Expansion dês Portugais dans l’Histoire de la Civilization); Diogo do Couto (Da Ásia – Década Nona); John Cruickshank (El Novelista Filosofo); Eva Curie (Madame Curie); Ramado Curto (O Preto no Branco; Do Diário de José Mário).
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LIVROS - O MELHOR DA VIDA

 

OS LIVROS DA MINHA VIDA
 
DE D   A F
 
JOSÉ LANÇA-COELHO
 
            Na continuação da rubrica iniciada no número anterior, passo a enunciar os livros que marcaram a minha vida, cujos últimos nomes dos autores começam pelas letras D, E, e F, cuja leitura simplesmente aconselho, como é óbvio.
 
D
 
Fernando DACOSTA, Máscaras de Salazar; DANTE, A Divina Comédia; Humberto DELGADO, Memórias; DESCARTES, Princípios da Filosofia, e, Discurso do Método;
Bernadette DEVLIN, A Minha Alma não Está à Venda; DIDEROT, A Religiosa; Júlio DINIS, O Espólio do Senhor Cipriano; Sant’Anna DIONÍSIO, Pedagogia Culminante dos Gregos, e, O Poeta essa Ave Metafísica (biografia de Teixeira de Pascoaes); DOSTOIEVSKI, Crime e Castigo; Marguerite DURAS, Os Insolentes; Lawrence DURRELL, Clea, e, O Livro Negro de Lawrence Durrell.
 
E
 
Umberto ECO, O Nome da Rosa, Bauduino, A Misteriosa Chama da Rainha Loana, O Pêndulo de Foucaut; Jorge EDWARDS, O Sonho da História; Thomas S. ELIOT, Assassínio na Catedral; Shusaku ENDO, Uma Vida de Jesus; ERASMO, Elogio da Loucura; Enrique Perez ESCRICH, O Manuscrito Materno; Florbela ESPANCA, Sonetos; ÉSQUILO, As Suplicantes; Albano ESTRELA, As Memórias que Salazar não Escreveu.
 
F
 
Oriana FALLACI, Carta a um Menino que não Nasceu; Almeida FARIA, A Trilogia Lusitana; Willikam FAULKNER, Luz de Agosto; Lucien FEBVRE, Martinho Lutero; Alonso FÉRIA, Born in 27; Millôr FERNANDES, Pif-Paf; Alberto FERREIRA, Ensaios da Filosofia para a História; David Mourão-FERREIRA, Gaivotas em Terra, Um Amor Feliz; João Palma FERREIRA, Na Tua Morte; José Gomes FERREIRA, Revolução Necessária, e, Aventuras de João Sem Medo; Vergílio FERREIRA, Aparição, Signo Sinal, e, Cântico Final; Celso Emílio FERREIRO, Poesia Galega Completa; Conde de FICALHO, Uma Eleição Perdida; Fidelino de FIGUEIREDO, O Medo da História; FLAUBERT, Madame Bovary, e, Bouvard e Pécouchet; Antgónio Barahona da FONSECA, Pátria Minha, e, Guia de Casados; Branquinho da FONSECA, Rio Turvo; Rubem da FONSECA, O Caso Morel, e, O Doente Moliére; José-Augusto FRANÇA, As Conferências do Casino no Parlamento, e, A Bela Angevina; Anatole FRANCE, A Ilha dos Pinguins, e, Contos Escolhidos; Pierre Mendes FRANCE, A Crise Francesa de Maio; Miguel FRANCO; O Motim; J.P. FREIRE (Mário), Quem são os Jesuítas; Gilberto FREYRE, Selecta para Jovens; Erich FROMM, O Medo à Liberdade.
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DOS 7 AOS 77

 

PÁGINA INFANTO-JUVENIL
JOSÉ LANÇA-COELHO
 
PENSAMENTO
 
            “ Há cores nacionais, traduzindo biologicamente a identidade dos povos.” Guerra Junqueiro (1850-1923) Escritor português.
 
 
ANEDOTA
 
            Diz o marido para a mulher:
            - Lembras-te como éramos felizes há 40 anos?
            - Há 40 anos, ainda não nos conhecíamos?
            - Por isso mesmo!
 
LENDA
DE
CHAVES
 
            Chaves tão depressa era moura como cristã. Quando D. Teresa casou com o conde D. Henrique, trouxe no seu dote, incluído no Condado Portucalense, a cidade que pertencera à ilustre família romana dos Flávios.
            Os mouros nunca desistiram da cidade, e assim, em 1129, reconquistaram-na pela última vez. Porém, 31 anos depois, isto é, em 1160, os irmãos Rui e Garcia Lopes conquistaram-na e entregaram-na ao rei de Portugal, D. Afonso Henriques.
            Há muitos séculos, havia uma inscrição gravada na igreja matriz da cidade que assinalava os túmulos dos irmãos Rui e Garcia Lopes, e que dizia assim:
 
                                   “Dois irmãos com as quinas
                                   Sem rei ganharam a Chaves
                                   Donde em roxo cristalinas
                                   Lhes foi dado por insígnias
                                   Em escudos cinco chaves.”
 
            A alusão às quinas, que só passaram a fazer parte da bandeira portuguesa depois da lendária batalha de Ourique, parece mostrar que, a conquista de Chaves, só teria acontecido depois daquele recontro.
            A palavra Chaves, deriva do romano ‘Aquae Flaviae’, cidade construída junto a algumas nascentes termais.
            O povoamento da região não foi iniciado pelos Romanos, uma vez que se achou um instrumento de pedra que parece ser do período da Idade da Pedra. Por outro lado, há vestígios de dólmenes ou antas e pinturas rupestres, como as do outeiro Machado. É, pois, provável que Aquae Flaviae tenha surgido sobre os restos de edificações castrenses primitivas.
 
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Quinta-feira, 23 de Abril de 2009

DE A a Z

 

DIÁRIO IRREGULAR
 
MIGUEL PAÇO D’ARCOS
 
Monte do Carrascal, Alentejo, 4 de Agosto 07 – Nunca pensei ter alguma coisa em comum com o actual Presidente da República, mas este (des)governo que tem o nome de socialista tem feito tantas leis contra os trabalhadores dos diversos sectores, que me congratulo por ver Cavaco Silva vetar a Lei de Imprensa aprovada pela maioria e, cujos maiores perigos passavam pelas condições de quebra do sigilo profissional e pelas sanções aplicadas aos jornalistas. A liberdade de expressão é fundamental à Democracia e quem ainda não interiorizou este simples conceito, não merece ser governo.
            O Primeiro-ministro confessou desconhecer a demissão compulsiva da directora do Museu de Arte Antiga. Era bom que abrisse os olhos para saber o que anda a desgovernar.
 
Monte do Carrascal, Alentejo, 8 de Agosto 07 – Estou-me nas tintas, literalmente, para a crise do BCP e respectivas guerrilhas internas que opõem J. Gonçalves a P.T. Pinto. Resolvam isso, se quiserem, com a vossa água benta.
            Partidos políticos receberam dinheiro vivo para as suas campanhas eleitorais às legislativas de 2005, quando eles próprios votaram na Assembleia um diploma contra esta acção. Vivemos na Democracia da contradição e, quem mais se contradiz, melhores resultados. É fartar vilanagem!
            O ‘Diário de Notícias’ de hoje traz o retrato robot dum ‘boy’ do PS, que não deixa de ser igual aos dos outros partidos, rotulando-o de “laico, republicano, socialista e costista desde pequenino”. O último adjectivo refere-se ao seu seguidismo que tem demonstrado por António Costa, desde que foi seu assessor no primeiro governo Guterres (1995). Rapazinhos, o que está a dar é a política! Abram bem os olhos e estudem este retrato robot, só têm a aprender e a lucrar. Nós cá estamos para pagar impostos para sustentar a vossa boa ‘vidinha’.
            A Rússia parece esquecer-se que a URSS terminou e que a Geórgia, com quem faz fronteira, hoje governada pelo pró-ocidental Mikhail Saakachvili, deixou de ser um seu pau mandado, desde 13 de Março de 1991, data em que referendou a sua independência. Muitas têm sido as acções russas contra a Geórgia, a última foi a invasão do espaço aéreo por aviões ‘S-24’ com o disparo de um míssil, verificada ontem. É difícil os senhores esquecerem que perderam as suas regalias e quem foram os seus servos forçados.
 
Monte do Carrascal, Alentejo, 11 de Agosto de 07 – O grande ditador cubano Fidel de Castro delegou o seu poder no mano Raul, e o regime teve ‘uma evolução na continuidade’, semelhante à que conhecemos em Portugal durante o fascismo, Salazar – Caetano. Coincidente com esta imobilidade, o regime libertou o dissidente Francisco Chaviano Gonzáles, de 53 anos, ex-professor de matemática e presidente do Conselho de Direitos Cívicos de Cuba. Condenado a 15 anos de prisão pela ‘divulgação de segredos de Estado e falsificação de documentos’, saiu ao fim de 13 anos, 3 meses e 3 dias de inferno, em que nos primeiros tempos esteve no isolamento, sem receber os seus familiares e em que foi espancado frequentemente pelos guardas. A libertação coincide com o aparecimento de um tumor no pulmão de crescimento acelerado e da obstrução das artérias coronárias e cardiopatia isquémica. É esta a misericórdia revolucionária castrista. Acrescente-se ainda que, no primeiro semestre deste ano, o número de presos políticos em Cuba diminuiu! de 283 para 246. Menos 37, registe-se. Já que estamos em marés de registos e de números, aqui fica outra informação assaz curiosa – a região espanhola da Extremadura abriu 101 cursos de português que abrangem 9 mil alunos, desde a primária ao superior, passando pelo ensino profissional. Estes números têm por base, do lado português, a necessidade de diariamente procurarem do outro lado da fronteira, serviços que não encontram na sua região, como idas ao médico, para além da poupança que significa ir ao supermercado e encher o depósito do automóvel; do lado espanhol, para além de um crescente comércio, uma grande curiosidade pela cultura portuguesa.
 
Monte do Carrascal, Alentejo, 12 de Agosto de 07 – À minha maneira, fui solidário com Xanana Gusmão e com a resistência timorense, quando os Indonésios assassinaram e torturaram o povo inocente de Timor-Leste. Cheguei a pôr uma camisola branca com a cara de Xanana na varanda, flutuando ao vento de liberdade que, vindo do glorioso dia do 25 de Abril de 1974, ainda existia nesse tempo em Portugal. Entretanto, a força da razão venceu e colocou Xanana na Presidência de uma nova república. Agora, o seu mandato chegou ao fim e, o mesmo Xanana foi eleito primeiro-ministro. Porém, como o Homem é igual em todas as latitudes, leio desgraçadamente, condoidamente, que no dia 10 do corrente, cem jovens timorenses participaram no ataque a um orfanato, destruindo as suas instalações e violando várias crianças, incluindo uma de 12 anos. Para quem como eu, desesperou com a trágica situação dos timorenses, vê-los agora a matarem-se uns aos outros, quando já têm o seu país e a sua independência, dá vontade de não acreditar mais, nunca mais, na humanidade. E esta notícia, chega-me no dia em que se comemora o 1º centenário do nascimento de Miguel Torga, o Poeta mais alto que o país teve nos últimos tempos, tempos de repressão e de assassínio, que ele combateu por todos os meios, o que lhe custou a prisão, a censura e a apreensão de livros. O Poeta-solidário de antes quebrar que torcer, não teve representação governamental nas comemorações desta efeméride, de certeza, porque este governo tecnocrata, neoliberal, sabe bem que Torga o criticaria pelas medidas antidemocráticas que têm tomado contra o povo português. A este propósito, e entre os muitos escabrosos exemplos que se poderiam citar, vejam-se as infelizes e energúmenas declarações do actual ministro da Saúde que, “vê sinais positivos nas listas de espera” para cirurgias. É pena que o ministro e os seus familiares não sejam um dos 208,6 mil cidadãos, que todos os dias esperam angustiadamente por uma operação que lhes salve a vida, enquanto os políticos desbaratam o dinheiro que nos sugam com a imoralidade dos impostos que nos obrigam a pagar. Talvez que assim o ministro não vislumbrasse qualquer sinal positivo. Por favor, ministro, não goze com as necessidades do povo que o elegeu.
 
Monte do Carrascal, Alentejo, 14 de Agosto de 07 – Hoje só posso render as minhas sinceras homenagens ao Rui Costa. O Benfica acaba de vencer o Copenhaga por 2-1, com dois fabulosos golos do “Maestro”. Obrigado, por mais uma alegria, grande RUI!
 
Monte do Carrascal, Alentejo, 16 de Agosto de 07 – Os jornais de hoje dizem que o homem mais rico do país, Belmiro de Azevedo, duplicou a sua fortuna de 1 milhão de euros para 2 milhões, só no ano passado. Não espanta, se levarmos em linha de conta que um dos seus muitos supermercados, situado em Loures, ontem, feriado nacional, não encerrou às 13 horas, como manda a lei em vigor, mas sim às 20. O referido estabelecimento fica agora sujeito a uma multa que vai até 25 mil euros, que se chegar a efectivar-se, coisa que duvido, não trará qualquer prejuízo ao patrão que, nas 7 horas que fez a mais, deve ter facturado, pelo menos, o dobro disso. Não dobrou ele um milhão de euros, só num ano?! O mais importante da questão, será saber se os trabalhadores da referida superfície comercial receberam as horas que trabalharam a mais e, além disso, pagas a dobrar, como preconizam as tabelas salariais para essas situações. Será que o senhor dobra, também se preocupou em dobrar os salários aos seus trabalhadores?
 
Monte do Carrascal, 17 de Agosto de 07 – Hoje no ‘DN’ vêm duas notícias, no mínimo surpreendentes. Assim, regista-se que, na p. 9, a jornalista Fernanda Câncio na sua coluna escreve um artigo intitulado “Ó DA GUARDA QUE EU TAMBÉM ‘DESINFORMEI’ NA WIKIPÉDIA”, onde informa que descobriu na Wikipédia um artigo sobre si cheio de inverdades. Para enfrentar isto, diz a articulista que, qualquer cidadão, « Tem três hipóteses: a) encolhe os ombros e repete “é a vida”; b) decide colocar um processo judicial aos responsáveis; c) procura apagar ou corrigir a entrada em causa.». Ora, a jornalista optou pelo expresso na última alínea, tendo sido, como ela escreve, acusada de “censora, vândala, uma inimiga da liberdade de expressão”.
            Mais adiante, nas pp. 42-43, surge outra notícia relativa à wikipedia, intitulada “Governo mudou perfil ‘online’ de Sócrates”, onde se escreve em subtítulo, primeiro, que “O Governo assume que melhorou o perfil sobre o primeiro-ministro” e, depois, “Assessor nega que Sócrates tenha dado instruções”.
            O texto da p. 9 apelando para a indignação de uma pessoa que se vê caluniada e que, tentando repor a verdade, é acusada de inimiga da liberdade de expressão, prepara-nos para as alterações enunciadas nas pp. 42-43, como se essas transformações tivessem a mesma matriz enunciada na p. 9, o que não é de todo verdadeiro. Deitando água na fervura, aparece uma caixa intitulada “O QUE FOI APAGADO”, que tem como subtítulo “O blogue Zero de Conduta detectou o que chamou de ‘censura’ na versão inglesa da enciclopédia ‘online’ “, de onde tiramos os seguintes extractos: “(…) O alegado grau universitário do primeiro-ministro português está sob forte discussão pública e nos media. Um caso forte tem sido construído sobre possíveis falsas declarações do primeiro-ministro quanto à sua licenciatura.”, “(…) Os documentos alegadamente provam que passou sete disciplinas em cujas aulas não participou.”, “Completou um MBA com uma nota de 12, num máximo de 20 [foi apagada a nota].”, “Passou brevemente pelo Instituto Superior de Engenharia de Lisboa.”
Assim se faz um trabalho de desinformação e intoxicação da opinião pública. Estamos aqui, estamos como na China, onde o Poder controla a Internet e quem lá pode entrar. Por favor, chega de chinesices!, para não dizer, em bom português, de vigarices!
 
 
PISCINA EM KIT
 
O MEU OÁSIS,
A MINHA CONSCIENTE MIRAGEM
AQUI NO ALENTEJO,
TEM 5 METROS E MEIO DE DIÂMETRO,
DÁ PARA 3 BRAÇADAS DE UMA PAREDE À OUTRA,
E QUALQUER FUNCIONÁRIO PÚBLICO,
POR MAIS PERSEGUIDO QUE TENHA SIDO O SEU SECTOR,
PELO ACTUAL GOVERNO,
PODE COMPRAR.
 
Monte do Carrascal, Alentejo, 19 de Agosto 07 – A revolta das pipocas, era o título adequado a uma acção trágico-cómica levada a cabo por um grupo ecologista, que recebe subsídios do Estado, para atacar as sementeiras de indefesos agricultores, também subsidiados pelo mesmo Estado, de milho transgénico, produto legalizado em Portugal, desde 2005. Embora haja prós:
 (a semente deste milho contém um gene resistente às pragas, as larvas nomeadas por ‘brocas do milho’; se obtêm, em termos médios, maiores rendimentos das colheitas e se reduz a imprevisibilidade; e, a Autoridade Europeia de Segurança Alimentar considera que, utilizando o milho MON 863 é improvável reacções adversas na saúde humana e animal e ao meio ambiente no contexto do seu uso proposto)
 e contras:
(os transgénicos resistem aos herbicidas o que pode trazer o aparecimento de superpragas e ao desaparecimento ecológico, proveniente da contaminação do solo e dos lençóis de água; as consequências negativas das novas variante só poderão ser percebidass daqui a muito tempo, entre elas, prevê-se o empobrecimento da biodiversidade, afectando negativamente o equilíbrio ecológico e a segurança alimentar; e, de acordo com o Greenpeace o consumo pode relacionar-se com o aumento de alergias e resistência aos antibióticos)
 relativas à sementeira de transgénicos,
 a área de cultivo quase quadruplicou entre 2006 e 2007, sendo o Alentejo, a região onde os agricultores mais aderiram a este tipo de cultura, com 2400 hectares.
            O que é verdadeiramente hipócrita:
é um grupo ecologista, subsidiado pelo actual Governo, e escoltado pela GNR, atacar um pequeno proprietário de milho transgénico, subsidiado pelo mesmo Governo.
            Conclusão: afinal isto não é a República das Bananas, sejamos exigentes, mas sim, o Desgoverno do milho transgénico!
 
 
Monte do Carrascal, Alentejo, 22 de Agosto 07 – A corrupção e as mordomias são tantas neste pobre país pobre (a repetição é deliberada), que quase se ergueu uma estátua a cinco administradores do Hospital Pedro Hispano, de Matosinhos, que renunciaram a ter carro de serviço, e com a importância destinada às viaturas, 175 mil euros, adquiriram equipamento necessário à unidade de neurocirurgia.
 
Monte do Carrascal, Alentejo, 30 de Agosto 07 – Que país é este, onde o Governo compra dez helicópteros para combater os incêndios de Verão, mas os aparelhos só podem começar a voar em Novembro? Ardessem as casas dos políticos, que logo veríamos os helicópteros no ar, logo no início do Verão. Paradigmático, é o caso que envolve a casa de campo, em Sintra, do actual presidente da Câmara de Lisboa, a cuja piscina, os aviões que combatiam o fogo na serra de Sintra, foram buscar água, não fosse o diabo tecê-las…
 
Monte do Carrascal, Alentejo, 2 de Setembro 07 – As notícias dizem que 45.000 professores ficaram sem emprego. A ministra da deseducação argumenta que a baixa natalidade é a principal culpada deste evento. Mas o que mais me preocupa é o que ouço na televisão – cerca de cem professores do 10º escalão, o último, o meu, que dou aulas há 33 anos, perderam o lugar nas escolas onde eram efectivos, por estarem destacados em outras, mais próximas da sua residência. Entretanto, o ministério acabou com os seus lugares nas suas escolas de origem e, também, fechou a vaga que ocupavam na escola mais próxima da sua residência. Ao fim de trinta e muitos anos de abnegação, entrega, fracos ordenados, stresse, estarem longe da família às semanas, vêem-se sem emprego na recta final da profissão que escolheram ou para a qual foram empurrados pelas contingências do desgoverno em que vivemos. Não tenho palavras para semelhante injustiça!
 
Monte do Carrascal, Alentejo, 3 de Setembro 07 – Este país, de dia para dia, vai ficando cada vez mais inconcebível. Hoje, soube-se que uma professora com cancro na língua, depois de lutar contra a mesma doença na mama e no útero, foi duas vezes á Junta Médica para conseguir a reforma, e de nenhuma das vezes, os médicos que a observaram, tiveram a misericórdia necessária para a dispensar do pesado e desgastante serviço lectivo. As ordens a que os discípulos de Hipócrates têm de obedecer, vêm de quem faz da língua, o principal instrumento para singrar na vida, para enganar os outros, para chegar aos fins sem olhar aos meios.
 
 
CARNAXIDE, 4 de Setembro 07 – Passei a tarde e a noite, no meu escritório, embrenhado nos meus papéis – recortes de vários jornais e revistas sobre escritores e livros. Até agora contabilizei 2.086 entradas, atenção que não são recortes, mas sim entradas. Portanto, tenho recenseados, pelo menos o triplo de recortes, se atribuir, benevolamente, três recortes por entrada, o que dá, no mínimo, mais de 6.000 recortes. E perante tanta papelada, levei o tempo todo, das 15 à 1h do dia 5, a lembrar-me do sentido de uma frase de Almada Negreiros que, embora não a recordando na totalidade, o sentido é o seguinte – «entrei numa biblioteca e, perante toda aquela vasta multidão de livros, pensei que teria de haver um outro modo de um homem se salvar, sem ter que ler aquilo tudo». Também eu, olhando esta profusão de recortes, me pergunto para que me servem tantas biografias e recensões de livros. Embora não o queira, tenho que cair em mim. Para que me serve tanta informação? A verdade, porém, é que não consigo parar esta colecção que comecei na minha adolescência.
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DE A A Z

 

ENCICLOPÉDIA PESSOAL
 
JOSÉ LANÇA-COELHO
 
PROUST, Marcel – O homem de Em Busca do Tempo Perdido de que apenas li Um Amor de Schwann. Descubro agora que, era homossexual. Filho único de uma família aristocrática, sempre doente, foi muito protegido pela mãe. Segundo o que li em Babelia, suplemento literário do El Pais, Proust teve uma enorme quantidade de amantes, na ordem das dezenas, quase todos empregados (de baixa qualidade, como paquetes, camareiros) dos hotéis onde permaneceu durante longas temporadas.
Proust não conseguiu publicar o primeiro volume de Em Busca do Tempo Perdido na Gallimard, porque o director desta editora na altura, André Gide, não acreditou na qualidade da obra.
 
DOYLE, Arthur Conan – O autor de Sherlock Holmes, o detective frio e racional, era dado ao Espiritismo, e isso não sucedeu após a morte do filho na Iª Guerra Mundial, como durante muito tempo se julgou, mas é muito anterior, pois na sua biblioteca, antes do primeiro conflito bélico da Humanidade, existiam já mais de setenta livros sobre Espiritismo. Com quarenta e tal anos, viúvo e já sem grandes objectivos, surgiu-lhe um caso real, como tantas vezes os seus leitores lhe pediam, que Conan Doyle agarrou com as duas mãos. Tratava-se de George  Edalji, solicitador, pequeno, solitário, meio-indiano e habituado ao racismo. Fora vítima de inúmeros ataques, que a polícia lhe atribuía. Edalji escreveu a Doyle, após ter sido condenado em tribunal. O escritor empenhou-se de tal modo que, conseguiu a criação do tribunal de recurso criminal, porém, ao contrário do que sucedeu em França com Dreyfus, Edalji nunca teve o estatuto de herói, apesar de Doyle, conseguir provar a sua inocência.
 
FICHTE – Este filósofo começou por ser um simplório pobre e analfabeto pastor de gansos em Rammenau, pequena aldeia alemã cuja única fama eram os inspirados sermões do padre, aos domingos. Um dia, um barão foi a essa aldeia para ouvir o sermão, mas chegou tarde. Foi então informado por um aldeão, que o moço que pastava gansos, o jovem Johann Fichte, lhe poderia repetir todo o sermão. Depois de Fichte lhe repetir tudo, o barão ficou tão impressionado com a memória do rapaz, que lhe pagou os estudos em Pforta, famoso colégio interno, por onde passaram filósofos como Nietzche. Seguiu-se a universidade, mas quando o barão morreu, teve de aceitar o emprego de tutor numa residência, onde dava lições sobre a filosofia de Kant, que desconhecia, a um jovem. Em breve, se encantou pela obra de Kant. Mais tarde, recebeu um convite para ser tutor em Varsóvia, para onde se deslocou a pé, pois não tinha dinheiro. No caminho, passou por Konigsberg, a cidade natal de Kant para o conhecer. Mas este não o recebeu. Fichte escreveu, então, o Ensaio de uma Crítica a toda a Revelação, utilizando a visão kantiana sobre a ética e o dever, conforme interpretados pela religião. Este texto impressionou tanto Kant, que, não só o recebeu, como incentivou a publicação do mesmo. Quando a Critica foi publicada, saiu anónima, levando os leitores a pensarem que era da autoria de Kant, dado o brilhantismo do texto. Kant informou publicamente que o autor do texto era Fichte, que foi convidado para dar aulas de filosofia na Universidade de Iena.
 
SCHOPENHAUER, Arthur (1788-1860) – Em 1820, aos trinta e dois anos, recebeu o primeiro convite para assumir um cargo temporário e muito mal remunerado para dar aulas de Filosofia na Universidade de Berlim. De imediato, marcou a sua cadeira, intitulada A Essência do Mundo, para a mesma hora da cadeira dada por Hegel, chefe de departamento e o mais famoso filósofo da época. Assim, enquanto 200 alunos se acotovelavam para ouvir Hegel, apenas cinco ouviram Schopenhauer definir-se como um vingador que veio libertar a filosofia pós-kantiana dos paradoxos vazios e linguagem obscura e deturpada da filosofia contemporânea. Os seus alvos eram Hegel e Fichte. No semestre seguinte, não teve um único aluno, nunca mais dando aulas.
         Nos trinta anos que viveu em Frankfurt, até morrer em 1860, levou uma vida tão rígida como a de Kant, começando por escrever três horas, a que se seguia uma hora a tocar flauta. Mesmo a meio do Inverno, raro era o dia em que não nadava no frio rio Meno. Almoçava sempre no mesmo clube, o ‘English Hof’, de casaca e peitilho engomado branco, traje que era a alta moda da sua juventude, mas estava completamente ultrapassado em Frankfurt, em meados do século XIX. Pagava dois almoços para garantir que ninguém se sentava na mesma mesa. Tinha a mania de discutir assuntos impróprios e chocantes como, por exemplo, elogiar a nova descoberta científica que impedia que adquirisse uma infecção venérea bastando, após o coito, mergulhar o pénis numa solução de cloreto. Costumava levar para junto da mesa onde almoçava, o seu poodle Atman, que tratava por Sir, chamando-lhe Humano, quando o cão se portava mal.
         Num jantar, um jovem perguntou qualquer coisa ao filósofo, a que ele respondeu “Não sei”. Como o jovem comentou: “Pensei, que o senhor, um sábio, soubesse tudo”. O filósofo respondeu: “Não, o conhecimento é limitado, só a estupidez é ilimitada.
         Qualquer pergunta sobre mulheres ou casamento tinha sempre uma resposta azeda. Assim, uma vez teve de aguentar a companhia de uma mulher muito faladora, que lhe contou detalhes de como sofria com o casamento. Ouviu-a pacientemente e quando a mulher lhe perguntou se compreendia, respondeu:
“- Não, mas compreendo o seu marido.” Noutra conversa, perguntaram-lhe se pensava casar-se, tendo respondido: “Não, pois só me traria aborrecimentos, porque teria ciúmes por a minha mulher me trair, pois eu ia merecê-lo por me ter casado.
         Segundo ele, os médicos usam duas letras diferentes, uma quase ilegível, nas receitas, e outra, clara e bonita, nas contas.
         “Só como celibatário se pode assumir o risco de viver sem trabalho e com poucos rendimentos.”
         A sua maior raiva, era contra os dois filósofos consagrados do s.XIX, Fichte e Hegel. Num livro, vinte anos depois da morte de Hegel, refere-se a ele como sofista e “um banal, oco, asqueroso, repulsivo e ignorante charlatão, que cometeu a inigualável afronta de escrever um conjunto de disparates pegados, que foi aclamado pelos seus seguidores mercenários no exterior como sendo uma sabedoria eterna”.
         Procurou na filosofia hindu o refúgio para o sofrimento pessoal.
         Escreveu ensaios pungentes e aforismos ácidos, sendo um dos poucos filósofos que Wittgenstein lia e admirava.
         Os temas principais do seu sistema são: volição, resignação e pessimismo; sendo o seu conceito, a vontade está acima do espaço e do tempo, mas seguir os seus ditames é o caminho mais rápido para a miséria. A sua obra principal é O Mundo como Vontade e Representação.
 
WOOLSTONECRAFT, Mary (1759-1797) – É uma feminista que escreveu a favor do igualitarismo dos sexos. Correspondeu-se com o filósofo inglês, conservador e anti Revolução Francesa, Edmund Burk. É a mãe de Mary Shelley, a autora do famoso Frankenstein. Defendia que o funcionamento da sociedade não devia basear-se na diferenciação dos sexos. As suas obras principais são: Vindication of the Rights of Women, Vindication of the Rights of Men.
 
NIETZSCHE, Friedrich – Algumas máximas inseridas no livro Quando Nietzsche Chorou, da autoria de Irvin D. Yalom, onde este filósofo se relaciona com o médico vienense Joseph Breur que é amigo de Freud, e que o trata através da psicoterapia, - a mãe da psicanálise, que será desenvolvida por estes dois amigos -, a pedido da sua amante, a escritora, feminista e psicanalista russa Lou Salomé, que, ao mesmo tempo, tem um ‘affair’ com o escritor Paul Rée, e que mais tarde será amante do poeta Rainer Maria Rilke. Breuer deixa-se dominar por Nietzsche para conseguir que, o segundo, descubra o que tanto o apoquenta, concluindo ser a solidão.
 
         Algumas máximas de NIETZSCHE:
 
“A esperança é o pior dos males!”
“Deus está morto!”
“A verdade é um erro sem o qual não conseguimos viver!”
“Os inimigos da verdade não são as mentiras, mas as convicções!”
“A recompensa final dos mortos é não morrerem mais!”
“Os médicos não têm o direito de privar os homens da sua própria morte!” (p.85)
“Os pensamentos são as sombras dos nossos sentimentos: cada vez mais escuros, vazios e simples.”
“Hoje em dia, já ninguém morre devido a verdades fatais; existem antídotos em demasia.”
“De que serve um livro que não nos transporta para além de todos os livros?”
“Qual é o sinal da libertação? Não se envergonhar perante si próprio!”
“Assim como os ossos, carne, intestinos e vasos sanguíneos estão encerrados numa pele que torna a visão do homem suportável, também as agitações e paixões da alma estão envolvidas pela vaidade; esta é a pele da alma.” (p. 87)
“Quem procura a verdade deve submeter-se a uma análise psicológica pessoal; o termo é «dissecação moral».”
“Os erros, mesmo os dos maiores filósofos, foram causados pela ignorância das suas próprias motivações.”
“Quem quer conhecer a verdade, deve primeiro conhecer-se totalmente a si mesmo. E para o fazer deve afastar-se do seu contexto habitual, até mesmo do próprio século ou país, para então se examinar à distância.” (p. 96)
“Transforma-te em quem tu és?”
“Tudo o que não me mata, fortalece-me.”
“Falo em conquistar ou dominar uma doença, mas quanto a optar … estou em dúvida, talvez uma pessoa escolha de facto uma doença. Depende de quem é a pessoa. A psique não funciona como uma entidade única. Partes da nossa mente podem funcionar independentes das outras. Talvez «eu» e o meu corpo formemos uma conspiração nas costas da minha própria mente. A mente, fique a saber, adora passagens secretas e alçapões.” (p.107)
“O desejo sexual também é um desejo de domínio sobre todos os outros. O «amante» não é alguém que «ama»; pelo contrário, almeja a posse exclusiva da amada. O seu desejo é excluir o mundo inteiro de um certo bem precioso. É tão egoísta como o dragão que guarda o tesouro! Não ama o mundo; pelo contrário, é totalmente indiferente às outras criaturas vivas.” pp. 186-7)
“Há uma divisão básica no estilo dos homens: aqueles que pretendam a paz de espírito e a felicidade, têm que acreditar e abraçar a fé, enquanto aqueles que pretendam perseguir a verdade, devem renunciar à paz de espírito e devotar a sua vida à investigação. Eu sabia disso aos vinte e um anos, há meia vida. É tempo de o senhor o aprender: deve ser o seu ponto de partida básica. Deve escolher entre o conforto e a verdadeira investigação! Caso escolha a ciência, caso opte por ser libertado das cadeias sedativas do sobrenatural, caso, conforme alega, escolha evitar a fé e abraçar o ateísmo, então não poderá, ao mesmo tempo, ansiar pelos pequenos confortos do crente! Se matar Deus, terá também que deixar o abrigo do templo.” (pp.189-190)
 
 
LUCRÉCIO – “Onde a morte está, não estou eu. Onde estou, não está a morte.” Eis uma verdade com uma racionalidade suprema e irrefutável. Porém, quando estou verdadeiramente assustado, ela nunca funciona, nunca acalma os meus temores. Essa é a falha da filosofia. Ensinar filosofia e aplicá-la na vida real, são empreendimentos bastante diferentes. (p. 220, “Quando Nietzsche chorou”)
publicado por cempalavras às 23:54
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DIÁRIO IRREGULAR

 

DIÁRIO IRREGULAR
 
MIGUEL PAÇO D’ARCOS
 
Monte do Carrascal, Alentejo, 14 de Setembro de 07 – Que país é este, onde as pessoas que têm cataratas, esperam 5 ou mais anos para serem operadas, e para tornarem a ver, têm que ir à Cuba de Fidel de Castro? Que país é este onde uma professora que tem cancro na língua não é reformada? Que país é este onde um hospital se recusa a administrar um medicamento a um doente canceroso, por considerar que esse paliativo é muito caro? Se isto é um país, onde o dinheiro é posto à frente da saúde e do interesse das pessoas, então o chamado capitalismo selvagem instalou-se neste país de Abril com todos os seus malefícios.
 
 
Monte do Carrascal, Alentejo, 24 de Setembro de 07
 
DÚVIDA OU DÍVIDA METAFÍSICA
 
Tu, poeta,
que há tanto cantas,
condenando, (claro!)
os desvarios da Humanidade
- traições, guerras e religiões –
as brincadeiras dos homens
- mísseis, bombas e foguetões –
as trapaças dos políticos
- promessas, falsidades e eleições –
as ignominias dos ditadores
- torturas, assassínios e prisões –
as maldades dos homens comuns
- roubos, assaltos e violações -
achas que com o que sabes do mundo
e com a tua avançada idade,
ainda podes ter
crises de identidade?
Ou fazes como a maioria,
e vives, ou vegetas, para,
- quotidianamente ganhar uns tostões –
encher a inestética barriga
- com pouco mais que uns feijões –
pagar a prestação da casa ao banco
- cujos juros transformam euros em milhões –
trocar de carro para saídas dominicais
- mostrando aos vizinhos que como tu são uns cagões –
pagar a cota mensal do teu clube
- que semanalmente só te dá desilusões –
ajudar a apaixonada filha no casamento
- que não chega a durar dois verões –
preparar a inevitável operação ao cancro
- feita por careiros e hipócritas cirurgiões –
pagar o caixão e o serviço fúnebre
- pois também a morte se paga a prestações –
e já depois de morto continuar a pagar
- os impostos de transmissões e sucessões –
a que o Governo de Maioria que tu elegeste
- democrática e funebremente te exige, e a que não te impões?
 
Entre a dúvida e a dívida metafísica
Pelo sim, pelo não,
É melhor optar pela segunda,
E deixares-te de crises de identidade,
Pois já tens idade.
De vegetar como se pode
Semanalmente,
De domingo a segunda,
E, se possível,
fugir a todos os impostos,
que democraticamente
nos são impostos.
 
 
Monte do Carrascal, Alentejo, 27 de Setembro de 07 – Hoje, os oftalmologistas do hospital Egas Moniz apresentaram um abaixo-assinado à administração daquele estabelecimento de saúde, reivindicando melhores e mais actualizados instrumentos oftalmológicos, uma vez que trabalham com máquinas que têm mais de 40 anos. Para estas coisas não há dinheiro, mas para os diferentes cargos políticos nunca falta. Notícia de ontem dizia que o governador do Banco de Portugal ganha mais que o seu congénere norte-americano. Imagine-se! Também ontem, noticiou-se que cinco pessoas que tinham sido operadas às cataratas num hospital português, sofreram graves danos na sua vista, ficando alguns sem ver para sempre, devido a uns microrganismos que afectavam o hospital. Bendita edilidade de Vila Real de Sto. António que paga viagens a Cuba aos seus munícipes para serem submetidos a cirurgias à vista! Nunca o adágio popular, «Em terra de cegos, quem tem um olho é rei!», foi tão bem aplicado!
 
Monte do Carrascal, Alentejo, 28 de Setembro de 07 – Acabo de ler na ‘Visão’, uma entrevista com António Lobo Antunes, onde o escritor afirma: «Não tenho a menor dúvida de que não há, na língua portuguesa, quem me chegue aos calcanhares. E nada disto tem a ver com vaidade porque, como sabe, sou modesto e humilde.» (sic) O que diria o homem se não fosse ‘modesto e humilde’? Nem quero pensar. E eu a pensar que só havia “Mourinhos” no futebol! Sou muito ingénuo…
publicado por cempalavras às 23:44
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DIÁRIO IRREGULAR

 

DIÁRIO
27 de Dezembro de 2008 – FALTAM 4 DIAS PARA 2009, ANO DE CRISE ANUNCIADA (COMO SE NÃO FOSSEM TODOS OS 365 DIAS QUE SE DESENRROLAM NESTE POBRE PAÍS?). ESTÁ UM DIA CHUVOSO, FRIO, ESCURO, QUE ME PODIA PÔR A ANGÚSTIA A CORRER POR TODAS AS VEIAS, SE NÃO FOSSE A EXISTÊNCIA DA A. ASSIM, A JORNADA PROPÍCIA À MALEITA EXISTENCIAL FOI UM DIA PASSADO ENTRE LEITURAS E ESCRITA NO ACONCHEGO QUENTE DO LAR. BENDITA A. QUE ME COMPLEMENTOU COM AQUILO QUE OS LIVROS NÃO PODEM DAR.
 
28 de Dezembro de 2008 – RELENDO PELA ENÉSIMA VEZ OS 16 VOLUMES DO ‘DIÁRIO’ DE MIGUEL TORGA, CONCLUO QUE SE TRATA DE UM EXCELENTE TRATADO DE CULTURA GERAL, ONDE O ESCRITOR REGISTOU AS SUAS IMPRESSÕES ACERCA DO QUE LEU E PENSOU SOBRE LITERATURA, HISTÓRIA E FILOSOFIA. UMA LEITURA IDEAL PARA QUEM QUEIRA AUMENTAR A SUA BAGAGEM DE SABER, FAZER UMA RETROSPECTIVA DE DIVERSAS ÉPOCAS HISTÓRICAS E, EM ESPECIAL, AQUELA EM QUE O MESTRE VIVEU.
 
29 de Dezembro de 2008 – FIQUEI A SABER QUE O ANO QUE ESTÁ A TERMINAR TERÁ MAIS UM SEGUNDO, PORQUE O MOVIMENTO DE ROTAÇÃO DA TERRA SE ATRASOU DEVIDO A TERRAMOTOS, VULCÕES E AO DEGELO DO POLO NORTE. NO QUE RESPEITA AO ÚLTIMO DOS FENÓMENOS, ASSINALA-SE, INFELIZMENTE, E MAIS UMA VEZ, A MÃO CRIMINOSA DO HOMEM.
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DIÁRIO
 
Monte do Carrascal, Alentejo, 1 de Janeiro de 1999
 
À LAREIRA
 
Com os olhos presos nas cores do lume
e com os ouvidos nos distintos sons de cada qualidade de madeira a ser devorada pelo fogo
sente-se a unidade da natureza
e como também o homem se pode extinguir a qualquer momento numa das diversas combustões que é a vida
descem pela chaminé as vozes desesperadas dos cães
que nos montes longínquos ladram aos múltiplos vultos de que a noite se serve para nos enredar
o corpo abandona-se ao torpor do calor
e o espírito pergunta aos sentidos se vale a pena escrever sobre uma coisa tão simples
como é estar à lareira
vivendo
 
CARNAXIDE, 20 de Janeiro de 1999 – Nesta paixão que tenho pelas biografias de quem «por obras valorosas da lei da morte se libertou», como dizia Camões, vim hoje tirar a prova real, - se é que ainda tivesse de dúvidas disso -, de como o homem é volúvel nas suas acções e pensamentos. Tomemos a vida do escritor português Alfredo Pimenta (1882-1950), e notemos os 360 graus do seu percurso político. Começou por ser militante anarquista, para em seguida se tornar defensor da causa republicana – esta transição já deixa transparecer um certo amolecimento. Porém, o que vem a seguir é de bradar aos céus. Em 1915, adere ao movimento patrioteiro e reaccionário conotado com a monarquia – o Integralismo Lusitano de António Sardinha -, que o levará depois à militância no Partido Monárquico. Quem julgava que era de hoje, que maoistas e estalinistas se tornaram liberais e social-democratas, que se desiluda. É por isso que, sem querer condenar ninguém, os homens que mais admiro são os que têm convicções duradouras, que vivem com elas desde que se conhecem até que a morte os liberta deste nojento lamaçal que é a existência.
 
CARNAXIDE, 24 de Janeiro de 1999 – Espantoso documentário sobre a vida e a obra do gravador Escher. Valha-nos a RTP2 e programas como ‘Artes e Letras’ para termos acesso a um pouco de cultura neste país impregnado de telenovelas brasileiras e música pimba portuguesíssima.
 
CARNAXIDE, 25 de Janeiro de 1999 – Descobri finalmente uma utilidade pedagógica para a chusma imbecil de telenovelas brasileiras que nos vão impondo e desaculturando. Ao ensinar o texto dramático, para estabelecer a diferença entre acto e cena, nada melhor do que me recorrer das imagens que quotidianamente a televisão inculca no espírito das crianças. Não houve um único aluno que não percebesse a diferença entre os dois conteúdos.
 
CARNAXIDE, 26 de Janeiro de 1999 – Aproveitei este sábado soalheiro para acabar de ler Nunca Permitas o Contágio e Os Poemas Possíveis de Fernando Almeida e José Saramago, respectivamente.
Monte do Carrascal, Alentejo, 9 de Fevereiro de 1999
a maior virtude de fernando pessoa foi conseguir ser vários em um
 
CARNAXIDE, 14 de Fevereiro de 1999 – Nesta segunda-feira de Carnaval, um hipócrita anúncio de um supermercado lembra os consumidores católicos que acabaram de entrar na Quaresma e que têm vários tipos de peixe à sua disposição, para não infringirem a lei que proíbe a fruição da carne, caso não possuam o dinheiro suficiente para pagar a ignominiosa e inqualificável bula. Aprendo que, pela lei dos católicos, estamos na Quaresma, o que para mim não tem qualquer valor ou podia até ter um outro nome, porém, o que tristemente constato é que a igreja católica já inventara o capitalismo selvagem, - em nome de Cristo -, antes de outros, considerando-se eruditos e inovadores, virem falar nisso como uma invenção dos tempos modernos. Em termos económicos temos todos, em múltiplos sentidos, muito que aprender com os representantes oficiais de Jesus. A aldeia global ensinou-me também que, para os chineses, a Quaresma iniciou-se hoje com o nome de ano do coelho, que vem substituir o ano do tigre… A cada cultura o nome que merece!
 
ALVERCA, 10 de Março de 1999 – Em mais uma digressão de divulgação de livros, fui surpreendido pelo raciocínio delirante de um jovem, que vive fora da realidade. Quando revelei que um autor ganha, em geral, 10% sobre o preço de capa, e exemplifiquei que em 700$00, ele só recebe 70$00, o petiz gritou esta frase patética: «Se fosse a si não vendia nenhum livro, para ganhar só isso, mais vale ficar com os livros todos!»
 
CARNAXIDE, 14 de Março de 1999 – Ao que chegou a economia de mercado, o consumo desenfreado em que vegetamos, onde ideologia e religião não resistem à forte tentação de multiplicar as patacas. Esta introdução vem a propósito das queixas dos fabricantes lusitanos de estatuetas de Nossa Senhora de Fátima, que se vêem ultrapassados pelos seus colegas chineses que produzem o mesmo bocado de barro a um preço muito mais competitivo, roubando assim o mercado de venda de ídolos aos primeiros. O que é a História! Há uns anos quem suporia que os operários saídos da grande Revolução Cultural competiriam com os subjugados pelo grande Chefe de Santa Comba Dão, na produção de um ícone religioso. E depois andam por aí uns tipos a dizer que a História acabou!
 
CARNAXIDE, 16 de Março de 1999 – Passei o dia no «1º Fórum de Projectos», a aprender o que os meus colegas de profissão têm feito nas diversas escolas. O melhor de tudo foi, talvez, o contacto que estabeleci para apresentar os meus livros em dois estabelecimentos de ensino, onde até agora nunca entrei, e a ‘festa’ que os meus antigos alunos me fizeram, alguns até me gritaram de dentro das salas onde estavam a ter aulas. Quando voltei para casa, agarrei-me aos ‘Diários’ de Torga, Vergílio Ferreira e Sebastião da Gama. Mais uma vez constatei que, um diário, é um registo simultâneo de banalidades e de factos históricos. É isso que faço neste registo quotidiano dos dias.
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DARWIN

 

DA MEMÓRIA … JOSÉ LANÇA-COELHO
 
 2º CENTENÁRIO DO NASCIMENTO DE DARWIN E 150 ANOS DA PUBLICAÇÃO DE A ORIGEM DAS ESPÉCIES
 
            “E ainda há sábios que acreditam que o homem descende do macaco!...Nós somos todos filhos de Nosso Senhor Jesus Cristo!...”
Foi com esta frase que um padre de nome Rogério, contratado apenas para a época da Páscoa, pregando um sermão da Quaresma na igreja açoriana de Ponta Delgada, terá tentado contradizer Darwin (nasceu a 12 de Fevereiro de 1809) e a sua teoria da Evolução das Espécies (publicou em 1859 A Origem das Espécies), depois de uma longa viagem (entre 27 de Dezembro de 1831 e 2 de Outubro de 1936) efectuada no navio ‘Beagle’, que tinha como missão cartografar o globo terrestre para a marinha inglesa, e onde o naturalista recolheu fósseis e exemplares de animais e vegetais, para além de explorar zonas desconhecidas e contactar com as populações indígenas.
            O que o padre Rogério desconhecia, tal como a grande maioria dos açorianos, é que na ilha de S. Miguel, vivia Francisco Arruda Furtado (1854-1887), um autodidacta que se interessava por Ciência e se correspondia com Darwin, para além de outros cientistas, nas línguas de Shakespeare e de Voltaire.
            Na verdade, escreveu seis cartas a Charles Darwin, tendo recebido resposta do famoso cientista inglês às quatro primeiras. Sabe-se até que Darwin o alertou para o facto de, Arruda vivendo numa ilha onde forçosamente existiam faróis, haveria também muitas mortes de pássaros contra os vidros das cúpulas desses avisadores da navegação, sendo por isso necessário inspeccionar os fragmentos de terra existentes nas patas e nos bicos desses animais, e enterrar esses mesmos fragmentos em terra preparada para cultivo, que depois seria tapada, com a incumbência de ver se da primeira terra germinariam quaisquer plantas, pois assim não só se poderia determinar a origem das aves, como também a evolução das espécies.
            Arruda terá escrito um opúsculo, publicado por certo em edição de autor, em Ponta Delgada no ano de 1881, e intitulado O Homem e o Macaco, que serviu de contestação à anticiência do reaccionário padre Rogério.
            Aqui, Arruda Furtado escreve: “ A semelhança do macaco com o homem, é um facto que o povo mais do que ninguém se diverte a mostrar. Ide para uma aldeia com um desses homens de realejo e mandril e ouvireis em todas as bocas: «Parece mesmo ser gente». Essa semelhança, reconhecida pelo próprio povo, impressionou mais de perto os homens de Ciência, e eles disseram, não que o homem e o macaco de hoje eram descendentes um do outro, mas somente que ambos deveriam ter sido produzidos pela transformação de um animal perdido e mais caracterizado como macaco do que como homem.”
            Furtado era um verdadeiro autodidacta no amplo sentido da palavra, e deste modo, recorrendo-se de outras ciências como a Paleontologia – “existe uma série imensa e graduada de macacos fósseis muito mais parecidos com o homem fóssil e com o selvagem actual, do que estes o são com o homem actual civilizado” – e a Embriologia – “a vida do embrião humano começa pela forma por onde igualmente começam, o cão, a galinha e a tartaruga, animais por certo muito mais diferentes dele do que o Gorila ou o Chimpazé”, chega à conclusão que, “se o homem devesse ter orgulho (…) nada havia mais glorioso do que ter vindo da funda eternidade por uma série de transformações, (…) apenas à custa do seu trabalho, (…) à custa da maior soma de lutas pela existência que tem podido sustentar uma espécie.”
            A terminar o opúsculo, Arruda reafirma o darwinismo – “E é por isso que, tendo podido dizer esse pouco que aí fica, nós julgamos ter cumprido um duplo dever – dar oportunamente um efeito salutar à insistência oca, com que se meteu nos sermões uma questão dessa natureza”, ao mesmo tempo que, dá uma forte alfinetada no dogmatismo da igreja católica servindo-se do padre Rogério, “dizer aos críticos do porvir que houve uma missão rogeriana, que nem toda a sociedade micaelense deste século aceitou, como o poderia ter feito o povo da China ou do Japão.”
            Já que falámos na igreja católica, citemos o pedido de perdão que a sua congénere, a igreja anglicana, apresentou a Darwin por o ter tratado mal, assumindo que reagiu de forma defensiva e emocional quando o cientista afirmou que o Homem descendia do macaco.
            Este pedido de desculpa surge numa altura em que outros sectores religiosos defendem que o Criacionismo – a teoria filosófica que se opõe ao Darwinismo e que, apoiando-se na Bíblia, preconiza que o mundo foi criado por Deus em sete dias – deve também ser ensinado na escola, ao lado do Evolucionismo.
            Para bem da Ciência, longe vão os tempos em que os representantes da igreja anglicana se davam ao luxo de dizer piadas como a seguinte: num debate realizado na carismática universidade inglesa de Oxford, em 1860, um bispo perguntou se era por causa dos avós que os darwinistas diziam que se descendia do macaco?
publicado por cempalavras às 23:14
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